terça-feira, 7 de setembro de 2010

Manipulação da opinião pública e independência judicial

 Manipulação da opinião pública e independência judicial

GUSTAVO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO
Juiz de direito,  mestre em ciências
jurídico-políticas pela Universidade de Lisboa,
coordenador de pós-graduação da ESMA-PB,
professor da Fundação Escola Superior
do Ministério Público da Paraíba -FESMIP

Não obstante o controle social sobre a magistratura ter grande relevância para a boa saúde das instituições democráticas, a opinião pública pode muito bem, em certas ocasiões, ser manipulada pelos meios de comunicação social ou estar vinculada a valores da maioria que não estão sintonizados com as normas constitucionais preponderantes no caso concreto. O juiz, nessa difícil conjuntura, deve, com coragem e racionalidade, fazer uso das prerrogativas de independência e de imparcialidade para, se for o caso, motivadamente decidir contra os interesses da opinião pública. Na situação, ao lado do princípio democrático de respeito à vontade da maioria, existe a garantia constitucional da pretensão de justiça da decisão e do respeito à minoria, porque é parte essencial da democracia a apropriada representação das minorias.
O julgador deve estar preparado para separar os legítimos valores comunitários dos interesses ocasionais de determinados grupos ou de maiorias eventuais e, o que é mais importante, sempre agir com justiça e com as normas constitucionais aplicáveis. Em casos controvertidos, é importante observar que a motivação, como instrumento legitimador da decisão, assoma de força e valor, obrigando o juiz a fazer um esforço redobrado para justificar seu ato decisório perante um auditório dividido ou amplamente hostil ao seu posicionamento. O juiz precisa, assim, cumprir o seu dever constitucional de demonstrar, pela motivação racional, a inexistência de qualquer arbitrariedade ou voluntarismo da decisão, procurando frisar que a efetiva preponderância de outros valores, – diferentes dos da maioria –, são mais adequados ao caso, por melhor se enquadrarem no figurino jurídico-constitucional da situação específica. Nesse sentido, é oportuno recordar a feliz advertência de Calamandrei: “há mais coragem em ser justo parecendo ser injusto, do que ser injusto para salvaguardar as aparências da justiça”. Como visto, a motivação não é só uma elementar cortesia do juiz, mas um rigoroso requisito do ato de sacrifício dos direitos no Estado democrático, é pela motivação racional e exaustiva que se põe à prova e se legitima a responsabilidade social do juiz de decidir com independência casos controvertidos ou contrariamente ao posicionamento de órgãos de imprensa ou da opinião pública.

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